Influência maior: Berlott Brecht – Teatro Épico
O TEATRO ÉPICO:
Debruça-se sobre o Homem, no seu constante devir - é uma luta permanente para transformar a sociedade.
Para isso, usa a técnica da Distanciação Histórica e o realismo.
É preciso procurar um facto histórico mais remoto e compará-lo com a realidade próxima que se quer denunciar. Ao criticar o passado, consegue transpor a mensagem para o presente, obtendo assim um paralelismo fiável.
Os actores não interagem com o auditório. O papel deles é apresentar uma ideia e não criar empatia. Deste modo, atinge-se a lucidez à o público formula juízos de valor.
OBJECTIVO: - Levar a sociedade (público) a tomar consciência da realidade.
PORQUÊ?
- A tomada de consciência leva à acção.
- A acção leva à mudança.
A OBRA:
Tempo da História: século XIX
Tempo da Escrita: século XX
PERSONAGENS:
É possível agrupar algumas personagens segundo as suas posições.
1. Os do Poder:
. D. Miguel Forjaz
. Marechal Beresford
. Principal Sousa
2. O Povo:
. Manuel, o mais consciente dos populares
. Rita
. O Antigo Soldado
. Vicente
3. Os Delatores:
. Morais Sarmento
. Andrade Corvo
. Vicente
As individuais:
. Frei Diogo de Melo, o homem sério da igreja
. António de Sousa Falcão, o amigo
. Matilde de Melo, a companheira de todas as horas
. General Gomes Freire de Andrade
Nota: Vicente é a única personagem que evolui na obra: começa como membro do povo e acaba no grupo dos delatores, elevado a chefe da polícia.
Manuel:
. Representa o povo oprimido e esmagado.
. É lúcido e consciente.
. Usa uma linguagem popular que combina com o realismo da obra.
General Gomes Freire:
. Único
. Com valores, íntegro
. Politicamente liberal, igualitário
Vicente:
. Desrespeita/ Despreza o povo – FALSO HUMANITÁRIO
. É contra o general
. Traidor, calculista
. Ambicioso, materialista
. Subtil, inteligente
. Egoísta
D. Miguel Forjaz:
. Anti-progressista/ retrógrado
. Conservador
. Autoritário
. Medroso
. Sem escrúpulos/ mercenário
. Corrupto – deixa-se corromper e tenta corromper os outros
. Vê o liberalismo como anarquia e caos
. Acha-se superior – absolutista: “Um mundo em que não se distinga a olho nu um nobre de um popular não é mundo em que eu deseje viver”
. Falso demagogo “Deus, Pátria e Família”
Marechal Beresford:
. Mercenário
. Lúcido e consciente
. Mau soldado, mas bom estratega
. Pragmático
. Calculista “não é prudente ainda dizê-lo”
. Ardiloso – trama a confusão mas não a integra
Principal Sousa:
. Corrompido pelo poder
. Deveria semear a paz e semeia o confronto
. Hipócrita
. Contra o liberalismo – odeia os francesas por causa das suas ideias
. Anti-progressista
. Cínico
Frei Diogo:
. O lado bom da igreja
. Homem com compaixão
. Conforta Matilde
. Defende Gomes Freire – corrobora a sua inocência
. Opõe-se ao Principal Sousa
Matilde de Melo:
. É a força do segundo acto
. Está desesperada
. Luta por: lealdade, justiça, verdade
. Digna
. Apaixonada e devota a Gomes Freire
. Por vezes, parece um pouco alucinada
. Culta, vivida
. Forte, lutadora, destemida
. Inteligente
. Grande poder de Argumentação (ver discussão com Principal Sousa)
. Oscila entre dois pólos:
. uma mulher feminina, frágil, consumida pela angústia, a suplicar pelo amor da sua vida, não temendo sequer contrariar princípios.
. uma mulher forte, destemida, que acusa os males do seu povo e denuncia a corrupção e a falta de índole, a tirania.
“Cortam-se as árvores para não fazerem sombra aos arbustos!”
AS DIDASCÁLIAS:
Existem as didascálias normais, que se seguem ao texto, e as didascálias marginais, típicas do teatro de Brecht. Estas corroboram o distanciamento histórico.
Luz/Sombra:
. A falta de luz no cenário (escuridão total) mostra o clima da época – o regime opressor, a ignorância do povo, a obscuridade.
. A intensa luminosidade no Manuel (primeira cena) corrobora a indicação inicial “Manuel, o mais consciente dos populares”. Luz é conhecimento, lucidez.
SÍMBOLOS:
A Moeda:
- a miséria do povo, a esmola
- o compromisso que o povo tem para com o General:
. É como uma medalha de honra para Matilde.
. É símbolo da fé que o povo tem no General.
. Mostra que povo não luta porque não pode.
- a traição da igreja (à semelhança de Judas, a igreja vende-se em nome do dinheiro e do poder)
A Fogueira:
- Por D. Miguel: símbolo de purificação, limpeza
. Quem não está connosco, está contra nós, é preciso afastar.
. Semelhança com a Santa Inquisição
- Por Matilde e Sousa Falcão:
. Profecia de mudança
. Purificação, redenção, chama da esperança
. Renascimento, advento
A Saia Verde:
- Em vida:
. Esperança
. Liberdade - Paris, Revolução Francesa
. Pureza, Inocência - neve branca
- Após a Morte:
. A alegria do reencontro
. A esperança de que a morte do General não seja em vão
. A esperança da mudança
O Preto de Sousa Falcão:
- Luto por si mesmo
- Auto-recriminação por não ter tido a coragem do General
- Se ele partilhava os mesmos ideais que o General, deveria ter dado a cara e lutado com ele
- Arrepende-se da sua cobardia
“Há homens que obrigam todos os outros a reverem-se por dentro”
O Título:
- Por D. Miguel:
. “Felizmente há luar” para se verem melhor as execuções e para que o medo conseguido seja maior a abranja mais pessoas.
. A Lua: monotonia, falta de liberdade de acção e expressão.
. Tal como a lua, os regimes déspotas só sobrevivem se os mais fortes estiverem controlados. Brilham com a luz dos outros.
- Por Matilde:
. O luar permite que mais gente veja a fogueira, mais gente vença o medo, mais gente se revolte e se una para mudar.
. O luar aumenta a amplitude da purificação. Mais irão percorrer em direcção à luz, à liberdade, ao conhecimento, à justiça, à democracia.
Relação entre a carga dramática de Matilde, o tempo da história e o tempo da escrita:
Escrito no século XX, em pleno auge do regime ditatorial de Salazar, e remetido para o século XIX, em pleno regime déspota, Felizmente há luar mostra-nos, claramente a censura e a falta de liberdade de acção, pensamento e expressão que se viveu nestes dois tempos.
Matilde aparece como a força do segundo acto, carregada de emoção, provocando o clímax da história. É ela quem denuncia e quem se revolta contra o movimento castrador que se desenvolvia por todo o país, quem ousa enfrentar opoder absoluto em prol da liberdade, da mudança e da democracia. Usa frases simples, mas fortalecidas com grande energia, coragem e direcção: “Cortam-se as árvores para não fazerem sombra aos arbustos”. Mostra-nos que toda e qualquer ameaça ao poder conservador e unidireccional era, imediatamente, aniquilado.
Matilde oscila entre dois pólos: num é uma mulher frágil e comovida que luta exclusivamente pelo marido inocente, vítima dos interesses mais altos do reino; noutro é a mulher forte e destemida que grita as condições do povo, a podridão das relações da igreja, a falta de índole da nobreza e a ignorância do povo. No entanto, em ambos os casos é uma lutadora, ávida por justiça, que acorda o público/sociedade para a lástima de pessoas que governavam em Portugal. As crises são cíclicas. Foi no século XIX, foi no século XX e foi em muitas outras ocasiões anteriores porque o Homem é assim: não aprende.